Quando as empresas tentam acomodar diferenças, confinam-se demasiadas vezes à diversidade tradicional – género, raça, idade, etnia, etc. Estes esforços são louváveis, mas os executivos que entrevistámos procuravam algo mais subtil: diferenças de perspetiva, hábitos mentais e assunções fundamentais.
O vice-reitor de uma das universidades mais importantes do mundo, por exemplo, costumava passear pelo campus à noite, para localizar os melhores investigadores. Sendo físico, esperava encontrá-los nos laboratórios. Para sua grande surpresa, encontrou-os em toda a espécie de disciplinas académicas: História Antiga, Teatro, ou no Departamento de Espanhol.
A organização ideal está consciente das correntes dominantes na sua cultura, dos hábitos de trabalho, código de vestuário, tradições e assunções mais importantes mas, tal como o reitor, faz esforços explícitos para as transcender. Estamos a falar não só da empresa de serviços financeiros conservadora que aceita os indivíduos da IT em calções e sandálias, mas também da organização moderna que não olha de esguelha alguém que use fato. Ou daquele lugar de trabalho onde quase toda a gente cumpre horários esquisitos mas que acomoda uma ou duas pessoas que preferem trabalhar das nove às cinco.
Por exemplo, na LVMH, a maior empresa mundial de produtos de luxo (que está em rápido crescimento), esperaríamos encontrar inovadores brilhantes e criativos, como Marc Jacobs e Phoebe Philo. E encontramos. Mas ao lado deles, vemos também uma proporção mais elevada do que seria de esperar de executivos e especialistas que supervisionam e avaliam ideias com uma concentração comercial analítica. Um dos ingredientes do sucesso da LVMH é ter uma cultura onde tipos opostos podem florescer e trabalhar cooperativamente. Uma seleção cuidadosa faz parte do segredo: a LVMH procura criativos que querem que os seus desenhos sejam comercializáveis e que, por sua vez, tenham mais probabilidade de apreciar supervisores capazes de detetar potencial comercial.
Os benefícios de juntar a gama completa de conhecimentos e talentos podem parecer óbvios e, contudo, não é de surpreender que tão poucas empresas o pratiquem. Por um lado, não é fácil fugir a preconceitos (pensemos no princípio de que partiu o diligente reitor, ao equacionar intensidade de pesquisa com trabalho no laboratório até horas tardias.) Porém, mais fundamentalmente, os esforços para alimentar a individualidade contrariam os esforços para aumentar a eficácia organizacional forjando sistemas de incentivo e percursos de carreira claros. Modelos de competência, sistemas de avaliação, gestão por objetivos e políticas de recrutamento rigorosamente definidas, todos vão afunilando a gama de comportamentos aceitáveis.
As empresas que forem bem sucedidas a estimular a individualidade, por isso, talvez tenham de prescindir de algum grau de ordem organizacional. Tomemos o exemplo da Arup, talvez a mais criativa empresa de engenharia e design do mundo. Muitos edifícios icónicos ostentam a sua marca distintiva – da Ópera de Sydney ao Centro Pompidou, passando pelo Beijing Water Cube.
A Arup tem uma abordagem holística do seu trabalho. Quando a empresa constrói uma ponte, por exemplo, vê além das preocupações do cliente imediato, pensando na região que a ponte vai servir. Ao fazê-lo, o pessoal da Arup colabora com matemáticos, economistas, artistas e políticos. A empresa considera a capacidade de absorver diferentes conjuntos de capacidades e personalidades como fundamental para a sua estratégia. “Queremos que existam partes interessantes, que não se encaixem muito bem... que nos levem a lugares aos quais não esperávamos chegar”, diz o chairman, Philip Dilley. “Isso é agora parte do meu trabalho: impedir que se torne demasiado ordenado”.
Os sistemas de avaliação convencionais não funcionam neste mundo, por isso a Arup não utiliza sistemas quantitativos de medição de desempenho, nem articula uma política corporativa sobre a forma como os empregados devem progredir. Os gestores deixam claras as suas expetativas, mas os indivíduos decidem como atingi-las. “Determinação pessoal significa definir o seu próprio caminho e ser responsável pelo próprio sucesso”, explica um responsável de RH. “O trabalho de desenvolvimento e progresso é individual, com o nosso apoio”.
Se isto parecer demasiado caótico para uma empresa mais convencional, consideremos o caso da Waitrose, uma das retalhistas alimentares de maior sucesso na Grã-Bretanha, de acordo com medidas tão diversas como a quota de mercado, lucros e lealdade do pessoal e dos clientes. Num setor que, necessariamente, se concentra numa eficiente execução de processos, a Waitrose vê a sua vantagem competitiva no incentivo a pequenas centelhas de criatividade que fazem uma grande diferença na experiência do consumidor.
A Waitrose é uma cooperativa: todos os empregados são co-proprietários que partilham os lucros anuais da empresa. Assim, a fonte de lealdade do pessoal não constitui grande mistério. Mesmo assim, a empresa envida grandes esforços para perceber e apoiar os interesses pessoais de cada trabalhador. Se alguém quer aprender piano, a Waitrose paga metade do custo das lições. Existe um clube cultural ativo – culinária, artesanato, natação, entre outros. Temos um amigo cujo pai aprendeu a velejar porque trabalhou para esta organização. Desta forma, a Waitrose consegue criar uma atmosfera em que as pessoas se sentem confortáveis por serem quem são. Ficámos surpreendidos quando um executivo sénior nos contou, “Os amigos e a família seriam capazes de me reconhecer no trabalho.”
“Os melhores negócios retalhistas dependem de pessoas que façam as coisas de uma maneira um pouco diferente”, explica outro executivo. “Ao longo dos anos, temos tido muitas pessoas dessas. Temos de ter o cuidado de as apreciar e garantir que o nosso sistema não as põe de parte”.
Quando procuramos a previsibilidade, damos por nós numa cultura de conformidade, aquilo a que Émile Durkheim chamava “solidariedade mecânica”. Mas empresas como a LVMH, a Arup e a Waitrose são forjadas a partir da “solidariedade orgânica”, que, argumentava Durkheim, se baseia na exploração produtiva das diferenças. Porquê dar-se a tanto trabalho? Pensamos que Ted Mathas, responsável pela companhia de seguros New York Life, o explica muito bem: “Quando fui nomeado CEO, a minha maior preocupação era se essa posição me permitiria dizer verdadeiramente aquilo que pensava. Para fazer um bom trabalho, eu precisava de ser eu. Toda a gente precisa.”
HBR//Rob Goffee, professor emérito de organização comportamental na London Business School, e Gareth Jones, professor convidado da IE Business School, em Madrid
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