No filme Uma Mente Brilhante, Russel Crowe encarna o genial matemático John Nash, que sofreu de esquizofrenia durante décadas
http://www.publico.pt/ciencia/noticia/maiores-analises-geneticas-de-sempre-da-esquizofrenia-confirmam-extrema-complexidade-da-doenca-1620693
Dois estudos publicados na
revista Nature com data desta quinta-feira revelam
novos dados acerca da complexidade genética subjacente da esquizofrenia. Não só
permitem concluir que esta doença psiquiátrica pode ser causada por múltiplas
mutações genéticas muito mais raras do que se pensava, como dão pistas sobre as
funções dos genes alterados.
A
esquizofrenia afecta 1% da população mundial e é caracterizada por alucinações
visuais e auditivas, delírios e paranóia, entre outros. Os doentes costumam ser
tratados com medicamentos antipsicóticos cuja eficácia pouco tem evoluído nos
últimos 20 anos.
Com base em estudos de
famílias com uma história da doença, sabe-se há bastante tempo que ela tem uma
forte componente hereditária. Porém, até aqui, as tentativas de identificar
genes específicos causadores da doença comuns a todos os doentes não têm tido sucesso.
Os dois novos trabalhos fornecem uma explicação para este aparente paradoxo.
Num dos estudos, Shaun Purcell, do Instituto
Broad (do MIT e de Harvard, nos EUA), e colegas de várias instituições
norte-americanas e europeias, compararam as sequências genéticas, colhidas pelo
Instituto Karolinska na Suécia, de 2536 pessoas com esquizofrenia e de 2543
pessoas que não tinham a doença. Os autores descobriram então “mutações
ultra-raras em dezenas de genes”, explica um comunicado do Hospital Mount
Sinai, de Nova Iorque, que participou no estudo.
No outro estudo (do qual Purcell é igualmente
co-autor), Menachem Fromer, do Mount Sinai e do Instituto Broad, e outra equipa
internacional procuraram mutações, desta vez não hereditárias mas espontâneas,
em amostras de ADN colhidas junto de 623 doentes esquizofrénicos búlgaros e dos
seus respectivos progenitores. E concluem que estas mutações novas (que são
contudo menos numerosas do que as hereditárias), para além de ter um papel no
desenvolvimento da doença, perturbam principalmente certos circuitos cerebrais
implicados na regulação da força das ligações entre neurónios – desempenhando
portanto um papel importante no desenvolvimento cerebral, na aprendizagem, na
memória e nas capacidades cognitivas.
De facto, a “tremenda
complexidade genética” (nas palavras de outro co-autor) agora revelada por
estes estudos fez com que nenhum dos genes identificados pudesse ser implicado
sem ambiguidade na doença, escrevem naNature os autores do estudo na Suécia. “Isso
sugere que há muitos genes de risco para a esquizofrenia e que é pouco provável
que dois doentes escolhidos ao acaso partilhem o mesmo perfil de risco
genético”, frisa Purcell num comunicado do Instituto Broad.
Todavia, o conjunto dos
resultados sugere – e isso constitui um substancial avanço, segundo os autores
– que as mutações agora identificadas afectam um tipo específico de redes de genes,
com funções ao nível da comunicação neuronal. “Este nível de convergência entre
vários estudos é inédito na genética da esquizofrenia e indica-nos, pela
primeira vez, que estamos perante um dos processos cerebrais de base que são
perturbados por esta doença”, diz Mike Owen, da Universidade de Cardiff (Reino
Unido) e co-autor do estudo junto da população búlgara, num comunicado da sua
universidade.
Esse estudo também detectou
que parte dos genes agora implicados na esquizofrenia já foi também associada a
outras doenças mentais tais como o autismo e a síndrome do X frágil, que
provoca atraso mental. “O facto de termos conseguido identificar um certo nível
de sobreposição entre as causas subjacentes à esquizofrenia e as do autismo e
da deficiência intelectual indica que estas doenças poderão ter alguns
mecanismos em comum e reforça a ideia de que é preciso integrar as pesquisas de
múltiplas doenças”, salienta Mick O’Donovan, outro co-autor da mesma
universidade britânica.
Os cientistas acreditam
que a genética irá contribuir para o desenvolvimento de tratamentos mais
seguros e eficazes da esquizofrenia. "O derradeiro objectivo deste tipo de
estudos é oferecer aos doentes tratamentos mais personalizados do que os
actuais”, diz Purcell.
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